A vida escoa-se aos poucos como grãos de areia que escoam por entre os dedos. O tempo passa, esse eterno viajante que não espera e não perdoa. as luzes vindas dos candeeiros de rua iluminam o quarto escuro onde me encontro, preenchendo o espaço vazio, reflectindo-se nas paredes despidas.
Sentada no chão ouço os poucos carros que ainda passam na rua e interrompem o silêncio do meu quarto. Tenho os olhos vermelhos das lágrimas que ainda há pouco derramei e que ainda escorrem pela minha face. Não consigo dormir, a minha alma inquieta procura a sua cura. Hoje, uma vez mais, o cansaço da vida voltou-me a atormentar, hoje voltei-me a sentir a LostSarah e não o que hoje sou. O passado voltou e com ele voltaram as lágrimas, a dor, as dúvidas, as eternas feridas abertas que constantemente tento remendar. Tantas palavras que guardei, tantas mágoas que fingi apagar, tantos sorrisos falsos que dei, tanto sarcasmo que usei, tanta máscara que coloquei.
Há 19 meses que quis mudar a minha vida, há 19 meses que me agarro a pequenas coisas, há 19 meses que escolhi o meu caminho,há 19 meses que enterrei o meu antigo eu. E desde há 19 meses que travo uma luta dentro de mim própria contra o meu antigo eu, mas hoje as minhas forças esgotaram-se. Ao olhar para algumas pessoas revejo-me a mim mesma e sem dar conta baixo a guarda deixando que a LostSarah tome conta de mim uma vez mais.
Há 16 meses que revelei um dos meus fantasmas à minha melhor amiga e há 16 meses que raramente o recordo. Mas agora sentada no chão frio sou assolada uma vez mais por fantasmas do passado. Por momentos sinto o ar escapar por completo dos meus pulmões como um flashback daquilo que passei. Não sou capaz de o admitir, porque uma vez mais há palavras que teimam em não sair de mim, que teimam em atormentar-me, em perseguir-me.
Os fantasmas monopolizam-me pois a coragem é pouca e as minhas mãos não conseguem concretizar aquilo qe eu mais anseio. a dor no peito aumenta por me sentir fraca, vulnerável... Sinto o coração estilhaçar-se uma vez mais e as lágrimas voltam aos meus olhos. Fecho os olhos por instantes e revejo toda a minha vida, ouço gritos, sussurros e choros ecoando na minha mente já debilitada. Quero gritar, mas a voz mais ma vez não sai. As lágrimas caem já dos meus olhos turvando-me a vista enquanto escrevo.
Por mais anos que passem sei que num ou noutro momento serei perseguida pelos fantasmas da minha vida e que uma vez mais não conseguirei afastá-los, combatê-los pois uma vez mais me faltará a coragem. Nos momentos de desespero anseio o dia em que tenha alguém a meu lado que me abrace enquanto as minhas lágrimas caem, não tentanto mudar o meu ser e aceitando-me tal como sou, com os meus fantasmas, os meus medos, as minhas fragilidades... Mas noutros momentos dou por mim a pensar que talvez nunca chegue a conhecer alguém por deixar que o cansaço me consuma de vez e que me leve para longe... O futuro é incognito e a noite ainda é uma criança...
As lágrimas caem... A alma grita... A coragem falta... O tempo passa... O passado volta... As lágrimas cessam... A alma adormece... A coragem é esquecida... O tempo passa... O passado é cada vez mais distante... O cansaço volta... As lágrimas caem... A alma grita... O tempo passa... O passado volta... As lágrimas cessam... A alma adormece... A coragem é desnecessária... O tempo passa... O passado é cada vez mais distante... O cansado volta... A alma grita... A coragem aparece... O tempo pára... Os fantasmas vencem... As lágrimas cessam... O passado morre comigo!
Dias e dias sob a máscara do fingimento. Dias e dias suportando o meu eu inventado.
Finjo ser o que não sou e enfrento o mundo de frente. Ergo a cabeça e finjo que nada nem ninguém me pode derrubar. Ignoro quem me detesta, rio dos que troçam de mim, rebaixo os que me chateiam, sorrio para todos os que dizem gostar de mim. Escondo-me por detrás de uma máscara de frieza e indiferença. E no fundo estou apenas a fingir.
Finjo para me proteger. Finjo para que ninguém me possa controlar. Finjo para assegurar que nunca ninguém terá acesso ao meu ser como tu tiveste, pois sei o quanto me magoou abrir o meu mundo a alguém que apenas o soube desprezar. Finjo porque sou fraca e indefesa. Finjo para apagar o vazio que ficou em mim. Finjo dia após dia.
Jamais, algum dia alguém me conhecerá realmente, pois guardarei sempre algo de mim, para que seja apenas meu. E mesmo quando a dor passar, sei que jamais poderei e conseguirei abrir o meu ser a alguém.
Magoa saber o que fui, magoa saber o que sou, magoa saber o que serei. Magoa saber que nunca mais partilharei tudo com alguém. Magoa ter perdido a capacidade de entrega. Magoa ter perdido a capacidade de confiar. Magoa fingir. Magoa....
Como estais alteza?- cumprimento-o com uma ligeira vénia, afastando dele os meus olhos. E sua alteza passa por mim, sem reparar, do alto da tua magnificiencia, envolvido no seu manto real. E aí começa o meu triste monólogo que sou incapaz de proferir na sua presença, por medo e por vergonha.
"Sabeis, majestade, o quão importante sois para mim? Do alto da sua altivez alguma vez olhou para baixo e reparou em mim, dama fiel e dedicada ao seu encantador Rei? Sei que não, não passo de um espectro, de uma entre as muitas damas que desejavam tê-lo, nem que por apenas por uma noite. Sim, meu Rei, sei que para si não passo de de uma dama tola porque espero que um dia posa reparar em mim e me fazer a sua rainha. Mas ao contrário de todas as outras, eu não desejo esse título, não desejo o poder, a riqueza e a fortuna que vós me poderieis dar, não, para mim bastava o vosso amor.
Em toda esta minha insgnificante existencia, tenho- vos seguido os passos, tentando que repareis em mim. Se escutardes com atenção sabereis que a voz que vos embala é a minha, que a voz que sussura palavras de consolo é a minha, que a voz que ouvis no silêncio do palácio cantando palavras de amor é a minha. Se vos dignares a escutar com atenção todos os murmúrios que vos perseguem, sabereis o quanto sois importante para esta dama a quem chamam tola por ainda acreditar no impossível.
Conheço o meu Fado e sei que nada posso pedir para mim, pois vós nunca me pertencereis. Vós nunca vos dignareis a deixar o vosso coração escutar a minha voz, sois demasiado orgulhoso para isso. Conheço o meu Fado e sei que a minha vida se resumirá apenas a seguir-vos os passos, pacientemente, a estar do vosso lado sem vós o noteis. Sei que a minha vida será sempre dedicada a vós, às vossas preocupações e tristezas, às vossas alegrias. Serei sempre a dama que vos embala no silêncio da noite, que vos clama palavras de amor, que vos limpa as lágrimas, sem nunca ser ouvida ou vista por vós. Triste condição a minha!" O meu monólogo é silenciado pela aproximação de passos lentos e arrastados, o meu Rei voltou à sala e sei que nada do que disse pode ser ouvido por alguém. O som dos passos torna-se mais forte, mais ensurdecedor.
E de repente regresso à realidade, tu não és o Rei e eu não a Dama, somos apenas nós, vivendo a mesma história, mas numa época mais recente.
Vento onde estás? Também tu me abandonaste? Também tu desististe de mim? Sinto-me só sem a tua companhia, sem as tuas palavras que me recordam aquio que por passei e o que devo e tenho de fazer. Onde foste? Já não ouço o teu sussuro quando percorro as ruas da cidade, já não ouço o teu grito a atravessar as frestas da janela.
Também tu não aguentaste acompanhar dia após dia o meu verdadeiro ser, que tu conhecias profundamente, também tu não conseguiste suportar conviver com o fantasma em que me transformei. Não suportaste ouvir o meu riso falso, que teimo em usar na escola, com os amigos apenas para me proteger e fingir que estou bem. Não suportaste continuar a acompanhar os meus arrastados passos, a minha continua mortificação e tortura.
Deixaste-me e por isso sei que nunca poderei mostrar o que realmente sou aos que me rodeiam, pois também eles me deixariam, pois nunca suportariam ver o que todos os dias eu vejo ao espelho.
Por favor vento, volta acompanhar os meus passos, quero voltar a sentir a tua brisa na minha pele, relembrando-me que apesar de todo o sofrimento ainda existe alguma vida em mim. Preciso da tua presença.
E a ti meu amor, que posso eu continuar a dizer? Também tu já me deixaste há muito, também tu foste embora. Há momentos em que apenas desejo ouvir a tua voz, sentir os teus braços a abraçar-me protegendo-me dos meus fantasmas, mas nunca mais terei essa possibilidade. Se ainda sinto o teu cheiro na rua? Sim, continuo a senti-lo e sinto um aperto no coração cada vez que isso acontece. Se soubesses o quanto ainda me pertuba sentir, ouvir, cheirar, ler algo que tenha um pouco do que eras, um pouco de ti, ou pouco da nossa história. Se soubesses a agonia constante em que ainda vivo por não te ter. Sim, talvez, já seja obsessão ou talvez não, não sei. Apenas sei que não está perto de mim e continuo a pensar em ti como se te visse todos os dias. Sinto a tua falta.
Não sei mais que caminho percorrer, sinto-me no meio de nada, perdida entre multidões que me atravessam sem notar. Não vejo o fim de tudo isto, não vejo o dia de amanhã, e mesmo o de hoje tenho dificuldades em o descobrir. Já não sou aquela rapariga que não se deixava abater e que lutava com todas as forças contra a tristeza. Simplesmente, já não tenho qualquer força a que possa recorrer para enfrentar a minha triste escolha.
Vento preciso de ti, das tuas palavras, preciso ter-te perto para conseguir enfrentar cada dia com a cabeça erguida, mesmo que por dentro esteja miserável. Volta depressa para mim, uma vez que o meu amor nunca mais vai voltar.
O fingimento em que vivo está a desaparecer. Sinto-me exposta a todos os que passam e que olham distraidamente. Não sei o que irei fazer no dia em que não conseguir fingir mais, no dia em que não conseguir esconder a minha fragilidade emocional. Tenho medo desse dia, no dia em que ficarei vulnerável a todos os que convivem comigo, mas que não têm acesso ao meu ser. Tenho medo da reacção dos que me rodeiam, não sei será de pena ou de desprezo.
A tua presente ausência a que não me consigo habituar tem sido cada vez mais sentida nestes últimos dias. Não consigo deixar-te sair do meu coração e da minha fraca mente. Não consigo ser racional quando penso em ti. E toda esta perturbação que provocas em mim me leva a ficar mais fraca e a não conseguir aguentar o papel a que me propus a representar. Não posso deixar que isso aconteça, não quero deixar que isso aconteça e contudo sei que por falar contigo destruo todas as minhas defesas contra os que me rodeiam. Mas não consigo afastar-me, não consigo evitar falar contigo, mesmo que a seguir chore sozinha no meu quarto. Se soubesses o que ainda passo por ti sei que não terias tido essa reacção quando me neguei a ligar a webcam. Ver-te e saber que tu me verias seria sujeitar-me novamente à tua doce tortura. Mas tu não sabes e por isso não te posso censurar. Sei que ver-te novamente provocaria um sofrimento atroz, pois agora, mesmo longe, quando sinto o teu perfume no ar me apetece gritar por ti, mas o grito não sai fica aprisionado ou é apenas um sussurro. Nunca fui capaz de gritar, de expressar tudo o que sentia, e por isso me dói ainda mais por guardo tudo, por silenciar tudo. Gostaria que um dia conseguisses ouvir o meu grito silencioso, o meu pedido de socorro e que nesse dia respondesses afirmativamente à minha necessidade de ti. Talvez seja já obsessão ou apenas o continuo sentimento que tenho guradado no meu coração. Por ti faria tudo, sempre foi assim e tu sabia-lo, mas talvez agora não saibas. Sempre foste especial apesar de imperfeito, sempre foste tu e mais ninguém que levou o melhor de mim. Nunca ninguém teve ou talvez terá o que tu tiveste de mim. E sei que se alguém mais tarde aparecer não terá o que tu tiveste terá algo diferente e provavelmente muito mais imperfeito, mas terá a minha realidade tal como tu tiveste, mesmo que essa realidade seja muito mais negra e disforme do que aquela a que tu tiveste direito. Só te peço que, se ainda tens alguma parte do que levaste de mim, a guardes para sempre, pois essa Sara foi sem dúvida a melhor de mim, pois quem vier depois de ti encontrará uma Sara menos sonhadora e muito mais insegura, uma rapariga de sorriso e olhar triste, com a alma desfeita. Guarda-me para sempre mesmo que nunca mais me recordes.
As estações sucedem-se uma após outra, os anos passam um após o outro e eu sinto-me presa a um tempo passado, a um tempo sem retorno. Já não sinto nada, estou estática e indiferente. Perdi a capacidade de amar alguém para além de ti, pois o meu coração transformou-se num cofre fechado que não quero abrir a ninguém. Sei que a culpa da minha indiferença, da minha incapacidade de voltar a amar e minha e apenas minha e odeio-me por isso.
Odeio tudo o que agora sou, odeio todas as decisões que tomo, odeio querer ficar presa a ti, odeio amar-te como te amo porque isso só me destrói. Quero ser diferente, quero sentir de novo, quero sorrir de novo, quero sonhar de novo, quero reinvertar-me. Mas todas as minhas tentativas fracassam, porque no fundo, e apesar de todo o ódio que tenho a mim própria pelo estado a que me votei, não quero mudar, não quero esquecer, não quero amar. Quero apenas ficar no passado, enquanto todos à minha volta caminham rumo ao futuro.
Não sei porque sou assim, porque insisto no que sei ser impossível. Não sei porque insisto em sofrer, em recordar, em lembrar histórias de amor fantasiadas, canções de amor com significado. Não sei porque insisto em fechar o meu coração para que apenas tu o ocupes quando tu há muito que me deixaste. Não sei porque insisto num nós inexistente desde sempre. Não sei.....
Sei apenas que não te odeio e nunca o fui capaz de fazer. Apenas te amo, mais do que devia, mais do que queria e odeio-me por isso. Por ti deixei de acreditar em príncipes encantados, em histórias de amor com final feliz, porque tudo o que estas contam eu não fui capaz de viver contigo.
Pergunto-me se algum serei capaz de amar outro alguém, se algum dia deixarei que alguém toque tão fundo o meu ser como tu tocaste, se algum dia entregarei o meu coração da forma como o entreguei a ti. Mas a resposta fica sempre em aberto. E odeio-me mais uma vez por chorar por não conseguir resposta. Odeio-me por tudo o que fiz até hoje e por aquilo que pretendo continuar a fazer. Odeio-me.
Hoje voltei a viver tudo o que tenho vivido nestes últimos anos. Como se o novo dia fosse a repetição perfeita do anterior, como se vivesse o mesmo dia vezes sem conta, sem nada de novo. Vivo cada dia na monotonia constante da minha realidade, na repetição constante de cada passo dado, na perfeição do replay do meu imperfeito ser.
Mais uma vez senti o teu perfume na rua, por entre os corredores da escola. Mais uma vez quis gritar e fiquei sem voz. Mais uma vez inventei uma nova personagem que não consegui interpretar. Mais uma vez inventei uma nova história para mim que se desfez mal senti o frio da rua. Mais uma vez coloquei uma máscara de fingimento. Mais uma vez fingi ser o que não sou. Mais uma vez quis chorar mas reprimi as lágrimas. Mais uma vez jurei a mim própria esquecer-te e no segundo seguinte voltei a pensar em ti. Mais uma vez murmurei o teu nome. Mais uma vez desejei ter-te aqui comigo. Mais uma vez desesperei com o que vi reflectido no espelho. Mais uma vez tive medo de mim. Mais uma vez me culpei por me ter votado a este degredo de alma e mais uma vez considerei uma boa escolha. Mais uma vez quis dizer-te que te amo e não o fiz. Mais uma vez quis ver-te e não pude. Mais uma vez quis voar para longe e reparei que já não tinha asas. Mais uma vez recordei a nossa história. Mais uma vez recordei o teu sorriso. Mais uma vez recordei as tuas lágrimas. Mais uma vez recordei o teu beijo. Mais uma vez senti a tua falta. Mais uma vez me senti sem forças. Mais uma vez atingi o limite da dor. Mais uma vez estilhacei a minha alma com as memórias do que fui, do que fomos. MAIS UMA VEZ QUIS MORRER E NÃO FUI CAPAZ.
Mais uma vez, e outra, e outra, e outra................
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.
. Odeio
. 10º Capítulo - Love Isn't...